Ao “rir” dos alertas de Kassab, Lula se parece cada vez mais com Dilma
Fraqueza do ministro da Fazenda e a sangria eleitoral do governo são imagens consolidadas que o presidente finge não ver
Correndo atrás da popularidade perdida, o presidente Lula decidiu conversar com jornalistas, nesta quinta, no Planalto. O evento foi comunicado aos veículos de imprensa poucas horas antes do início e ocorreu um dia depois de o petista ouvir duras verdades de aliados do governo. Como ficou feio, o petista precisava responder.
Na quarta, vazaram as declarações do presidente nacional do PSD, Gilberto Kassab, num evento com investidores, sobre a debilidade eleitoral de Lula — “um candidato forte, mas que perderia a eleição se fosse hoje” — e a fragilidade de Fernando Haddad na Fazenda: “Vemos uma dificuldade do ministro Haddad de comentar. Ele é um ministro fraco”.
Na mesma linha de Kassab, o presidente nacional do Republicanos, Marcos Pereira, afirmou ao Globo que Lula comanda hoje um “governo sem rumo” e que a tendência da sigla, que tem cargos na máquina petista, é seguir com a centro-direita em 2026.
Durante a conversa com jornalistas, Lula buscou transparecer otimismo, ainda que, em alguns momentos, tenha flertado com o negacionismo e demonstrado viver no mesmo universo paralelo já habitado por Dilma Rousseff em outros tempos no Planalto.
“Quando eu vi a história do companheiro Kassab, eu comecei a rir”, disse Lula sobre as declarações do cacique aliado.
Em 2015, quando já sofria com o isolamento no Parlamento e fortes índices de impopularidade, Dilma também desdenhava de aliados que buscavam alertá-la sobre o declínio de seu governo.
Lula, diferentemente de Dilma, ainda não está sob risco de impeachment, mas enfrenta uma onda de descrédito que lembra o início da tormenta sobre a “presidenta”. As principais forças econômicas do país, ainda que insatisfeitas com esse governo, querem que a gestão termine em 2026, de preferência, com a aposentadoria do petista e de Jair Bolsonaro na carona.
O erro de Lula está em insistir no negacionismo fiscal — descartando ajustes e insistindo em ignorar a conjuntura econômica — e fazer de conta que não percebe a fragilidade de seu principal ministro do governo.
Quando um político calculista como Kassab, que quase nunca coloca a cara na rua para mostrar o que pensa, diz que o ministro da Fazenda é fraco, é porque essa imagem está mais do que cristalina.
Na política, os rótulos costumam ser perigosos quando encaixados perfeitamente ao personagem. Michel Temer sofreu com a imagem de vice decorativo no governo Dilma, mas não conseguia negar essa realidade.
A fragilidade de Haddad vai na mesma linha. A diferença, em algumas rodas do mercado, é que a constatação é feita com certo ar de lamento — “Haddad tem boas ideias, pena que não tem força para implementá-las” — e não de crítica, como soou Kassab: “É um ministro fraco”.
Lula, a futura ministra palaciana Gleisi Hoffmann e o chefe da Casa Civil, Rui Costa, têm especial responsabilidade nessa aura de fragilidade que envolve Haddad no governo.
Quando avisou que daria entrevista, nesta quinta, sobre tema livre, o petista lançou no ar a esperança de que pudesse, de fato, sair em defesa do chefe da Fazenda.
Ele até tentou, mas o negacionismo falou mais alto: “Haddad é um ministro extraordinário na Fazenda… Rombo fiscal existiu no governo passado, de quase 2,6%. No nosso não houve”.