Em conversa com traficante do Complexo de Jacarepaguá, clonador de carros diz que consegue armas com CACs
A Rua Araticum, antes uma das mais pacatas da região, virou alvo de disputa entre o tráfico e a milícia. Com recordes de assassinatos, hoje é conhecida como a 'Rua da Morte'. Moradores da Grande Jacarepaguá denunciam que traficantes cobram para estacionar e para manter barricadas Um áudio obtido pela polícia em uma investigação sobre crimes envolvendo traficantes da Grande Jacarepaguá mostra um criminoso dizendo que consegue obter pistolas e munições com CAC - sigla para pessoas registradas como colecionadores, atiradores esportivos ou caçadores. A gravação foi mostrada com exclusividade pelo RJ2. O áudio em questão é uma conversa entre o traficante traficante Juan Breno Malta Rodrigues, o BMW - um dos responsáveis pelo tráfico em Jacarepaguá - e Thiago Fernandes Virtuoso, o Tio Comel, que está preso desde 2022. De dentro da prisão, o bandido explica como conseguir a munição da pistola com quem é CAC: “O cara pegou, falou que ia pagar R$ 12 mil. Maior pistolão, Breno, papo reto. Maior pistolão, 45, mano. Os 'bagulho' dela é tudo fácil, mano, de conseguir. Os 'cara' que tem CAC 'compra' molinho”. “Que bala é caro o que, mano... Os 'cara' do CAC 'compra' barato, pô. Eu vou ver aqui quem tem”, diz um dos homens. Tio Comel é conhecido na polícia como o maior clonador de carros do Rio. E mesmo preso, segundo as investigações, ele continua nessa atividade, numa espécie de revendedor de carros roubados. “Eles têm acesso muito fácil há uma diversidade de veículos. No decorrer da investigação, a gente teve acesso a informações de uma grande quadrilha de roubo e clone de carro. Essa atuação do tráfico, do aumento do crime de roubo de veículo, tá muito ligada a essa expansão. Eles roubam e imediatamente levam para um ponto onde refazem a placa, fazem chassi. Já põe o carro ou a serviço do tráfico ou o carro é vendido para gerar renda pro tráfico”, fala o delegado adjunto da Delegacia de Homicídios da Capital (DHC), Leandro Costa. Taxa de barricadas O RJTV tem mostrado nos últimos dias reportagens sobre a expansão do Comando Vermelho na Zona Oeste. A facção invadiu áreas que eram controladas por milicianos ou que não estavam sob domínio de criminosos e adotou práticas como a extorsão para acesso a serviços básicos. Moradores da Grande Jacarepaguá, na Zona Oeste do Rio, denunciam que traficantes cobram para estacionar e para manter barricadas. O avanço do crime organizado sobre a região de Jacarepaguá aconteceu em menos de 2 anos. A Rua Araticum, no Anil, é um exemplo da velocidade com que quadrilhas dominaram a região. Até meados de 2022, era uma rua conhecida na vizinhança pela tranquilidade. Parte dela é uma área de casas e condomínios, nos pés da Floresta da Tijuca, com trilhas que levam a cachoeiras, como a do Quitite, no alto da rua. Hoje, justamente essas características geográficas fazem dessa rua um ponto de disputa entre o tráfico e a milícia — sobretudo na região conhecida como sertão, que dá acesso a pontos de interesse das quadrilhas, como Rio das Pedras e Muzema. “Foram botando ponto de venda de drogas ali. Essa região foi uma região que teve muitos mortos, porque tinham vítimas tanto do tráfico quanto da milícia. Como é uma região de fronteira, por vezes os traficantes matavam gente envolvida com a milícia, e milicianos matavam pessoas envolvidas com o tráfico. Então, estourou o número de homicídios naquela região. Então a Araticum ficou, inclusive, conhecida como a Rua da Morte", explica o Leandro Costa Leandro Costa, delegado adjunto da Delegacia de Homicídios Reprodução/TV Globo LEIA TAMBÉM: Conversas revelam terror da quadrilha que tomou bairros da Zona Oeste; bandidos debatiam até arrancar coração de vítima Mortes na Grande Jacarepaguá mais que dobraram com guerra entre tráfico e milícia; em 2 anos, houve 684 homicídios na região A venda de drogas continuou, mas o que ajudou a alavancar as receitas do Comando Vermelho foram as extorsões a moradores e comerciantes. Serviços públicos e particulares, como água, luz, gás e internet, são taxados pelos criminosos. Moradores precisam pagar mensalidade até para estacionar na rua. Há poucos meses, traficantes criaram uma outra tarifa: a chamada “Taxa de Barricada”. Comerciantes são obrigados a pagar para ajudar o tráfico a colocar obstáculos nas ruas. “A Taxa de Barricada fica com uma construção de barricadas dentro da comunidade. No Jordão, por exemplo, se não pagar, a gente é obrigado a fechar a loja. Todos os comerciantes são obrigados a pagar a Taxa de Barricada”. Áudios e conversas da quadrilha foram obtidos pela Delegacia de Homicídios durante a investigação que apurou a morte dos médicos na Barra da Tijuca, em 2023. O conteúdo ajudou a polícia a entender como a facção age e abrir novas frentes de investigação. “Mandou 'nós' tomar a casa, tá ligado? 'Nós' foi e botou a mulher pra ralar, tá ligado? Aí, tipo, o Lesk falou: ‘vende a casa e cada um tira tua parte, dá 10 mil pra cada um de parte’. O cara tá vendendo a casa por 120 mil”. Em
A Rua Araticum, antes uma das mais pacatas da região, virou alvo de disputa entre o tráfico e a milícia. Com recordes de assassinatos, hoje é conhecida como a 'Rua da Morte'. Moradores da Grande Jacarepaguá denunciam que traficantes cobram para estacionar e para manter barricadas Um áudio obtido pela polícia em uma investigação sobre crimes envolvendo traficantes da Grande Jacarepaguá mostra um criminoso dizendo que consegue obter pistolas e munições com CAC - sigla para pessoas registradas como colecionadores, atiradores esportivos ou caçadores. A gravação foi mostrada com exclusividade pelo RJ2. O áudio em questão é uma conversa entre o traficante traficante Juan Breno Malta Rodrigues, o BMW - um dos responsáveis pelo tráfico em Jacarepaguá - e Thiago Fernandes Virtuoso, o Tio Comel, que está preso desde 2022. De dentro da prisão, o bandido explica como conseguir a munição da pistola com quem é CAC: “O cara pegou, falou que ia pagar R$ 12 mil. Maior pistolão, Breno, papo reto. Maior pistolão, 45, mano. Os 'bagulho' dela é tudo fácil, mano, de conseguir. Os 'cara' que tem CAC 'compra' molinho”. “Que bala é caro o que, mano... Os 'cara' do CAC 'compra' barato, pô. Eu vou ver aqui quem tem”, diz um dos homens. Tio Comel é conhecido na polícia como o maior clonador de carros do Rio. E mesmo preso, segundo as investigações, ele continua nessa atividade, numa espécie de revendedor de carros roubados. “Eles têm acesso muito fácil há uma diversidade de veículos. No decorrer da investigação, a gente teve acesso a informações de uma grande quadrilha de roubo e clone de carro. Essa atuação do tráfico, do aumento do crime de roubo de veículo, tá muito ligada a essa expansão. Eles roubam e imediatamente levam para um ponto onde refazem a placa, fazem chassi. Já põe o carro ou a serviço do tráfico ou o carro é vendido para gerar renda pro tráfico”, fala o delegado adjunto da Delegacia de Homicídios da Capital (DHC), Leandro Costa. Taxa de barricadas O RJTV tem mostrado nos últimos dias reportagens sobre a expansão do Comando Vermelho na Zona Oeste. A facção invadiu áreas que eram controladas por milicianos ou que não estavam sob domínio de criminosos e adotou práticas como a extorsão para acesso a serviços básicos. Moradores da Grande Jacarepaguá, na Zona Oeste do Rio, denunciam que traficantes cobram para estacionar e para manter barricadas. O avanço do crime organizado sobre a região de Jacarepaguá aconteceu em menos de 2 anos. A Rua Araticum, no Anil, é um exemplo da velocidade com que quadrilhas dominaram a região. Até meados de 2022, era uma rua conhecida na vizinhança pela tranquilidade. Parte dela é uma área de casas e condomínios, nos pés da Floresta da Tijuca, com trilhas que levam a cachoeiras, como a do Quitite, no alto da rua. Hoje, justamente essas características geográficas fazem dessa rua um ponto de disputa entre o tráfico e a milícia — sobretudo na região conhecida como sertão, que dá acesso a pontos de interesse das quadrilhas, como Rio das Pedras e Muzema. “Foram botando ponto de venda de drogas ali. Essa região foi uma região que teve muitos mortos, porque tinham vítimas tanto do tráfico quanto da milícia. Como é uma região de fronteira, por vezes os traficantes matavam gente envolvida com a milícia, e milicianos matavam pessoas envolvidas com o tráfico. Então, estourou o número de homicídios naquela região. Então a Araticum ficou, inclusive, conhecida como a Rua da Morte", explica o Leandro Costa Leandro Costa, delegado adjunto da Delegacia de Homicídios Reprodução/TV Globo LEIA TAMBÉM: Conversas revelam terror da quadrilha que tomou bairros da Zona Oeste; bandidos debatiam até arrancar coração de vítima Mortes na Grande Jacarepaguá mais que dobraram com guerra entre tráfico e milícia; em 2 anos, houve 684 homicídios na região A venda de drogas continuou, mas o que ajudou a alavancar as receitas do Comando Vermelho foram as extorsões a moradores e comerciantes. Serviços públicos e particulares, como água, luz, gás e internet, são taxados pelos criminosos. Moradores precisam pagar mensalidade até para estacionar na rua. Há poucos meses, traficantes criaram uma outra tarifa: a chamada “Taxa de Barricada”. Comerciantes são obrigados a pagar para ajudar o tráfico a colocar obstáculos nas ruas. “A Taxa de Barricada fica com uma construção de barricadas dentro da comunidade. No Jordão, por exemplo, se não pagar, a gente é obrigado a fechar a loja. Todos os comerciantes são obrigados a pagar a Taxa de Barricada”. Áudios e conversas da quadrilha foram obtidos pela Delegacia de Homicídios durante a investigação que apurou a morte dos médicos na Barra da Tijuca, em 2023. O conteúdo ajudou a polícia a entender como a facção age e abrir novas frentes de investigação. “Mandou 'nós' tomar a casa, tá ligado? 'Nós' foi e botou a mulher pra ralar, tá ligado? Aí, tipo, o Lesk falou: ‘vende a casa e cada um tira tua parte, dá 10 mil pra cada um de parte’. O cara tá vendendo a casa por 120 mil”. Em partes de Jacarepaguá, o tráfico, que antes extorquia dinheiro para que os moradores usassem os serviços de internet que já existiam, agora criou as próprias empresas. “Viram que o negócio é bom, por que não ficar com tudo? A fatia do bolo toda?” Um morador diz que a instalação custa R$ 400, e para manter, são mais R$ 150. Os bandidos se apropriam de qualquer fonte de renda, legal ou ilegal. “Cortam a sua internet, eu tinha internet, cortaram todas. Só tem uma, só pode uma”. 'Bagulho dá maior dinheirão' O traficante Juan Breno Malta Rodrigues, o BMW Reprodução/TV Globo Em outra conversa, um traficante relata ao chefe que pegou homens furtando cabos de energia e pede orientação sobre o que fazer. “Se eles 'quiser' continuar trabalhando nesse bagulho lá roubando fio, mas vai ter que trabalhar pra 'nós', mano. Bagulho dá maior dinheirão, mano. Só aqueles 'fio' ali que eu vi ali na filmagem ali, ali dá mais de 15, 20 mil, mano”. “Nós 'vai' botar na kombi, entendeu? Vai vender no ferro-velho, vai dar a parte deles e vai ficar com a parte da firma. Mas eles 'vai' trabalhar pra nós, mané”. Com mais dinheiro entrando, os traficantes compram mais armas e fortalecem a quadrilha como um todo. Em uma conversa investigada pela polícia, traficantes falam a sobre compra de munição para fuzis. “Aí, o moleque tá trazendo aqui três caixas de AR e uma de 62”. “De 223, não serve não. Mas a de 62, serve. E a de 40 e a de 9 serve também. Manda trazer. De 223, não pega no fuzil não, estraga o fuzil”. O que diz a Seap Sobre as conversas entre um criminoso preso com outros traficantes, a Secretaria de Administração Penitenciária (Seap) disse que, desde que recebeu a informação, fez 10 revistas no presídio em que Thiago Fernandes Virtuoso, o Tio Comel, está e que 16 celulares foram apreendidos, mas nenhum na cela dele. Nesta quarta-feira (5), em nova vistoria, a Seap disse que encontrou um aparelho perto da cama do detento e abriu um procedimento administrativo para apurar o caso.