Portas e Moçambique
Desde há já bastante tempo que vou vendo, não sempre mas habitualmente, a coluna dominical de Paulo Portas no telejornal da TVI. Portas fala bem, prepara-se, e está informado sobre as coisas do mundo - sai do rame-rame da politicazinha portuguesa, das cercanias dos "Passos Perdidos", e aborda com consistência (apesar da brevidade do programa) temas excêntricos às ladainhas dominantes no abundante "clube de comentadores". Para além de que pessoa que me é muito querida ter sido recentemente sua aluna e me ter confidenciado que o homem é um excelente professor, o que me reforçou a atenção. Ainda para mais porque este ofício de "comentador generalista" é a actual sequela, por paupérrima que seja, da velha figura do "intelectual público", pelo que convém ir sabendo o que os seus oficiais - os poucos melhores e os muitos piores - impingem aos incautos... Enfim, adiante, ontem vi a sua apresentação. E desatei-me a rir, sozinho, ao ouvi-lo falar de Moçambique, país que o ex-ministro bem conhece. Pois na sua apologia ao poder agora empossado, Portas anunciou-nos que o novo governo nada tem a ver com o poder anterior... Eu não sou politólogo, daqueles que têm conhecimentos "etnográficos" sobre os "campos políticos" locais, sabedores enciclopédicos do "quem é quem", verdadeiros "coleccionadores de borboletas" e especialistas em previsões de teias urdidas e rompidas. Sou apenas um tipo que usa a rede "Whatsapp", que tem o telefone carregado de mensagens a darem conta das imensas continuidades, pessoais e colectivas, políticas entenda-se, normais que sejam, entre o governo moçambicano anterior e o actual. E interrogo-me, mero telefone na mão, sobre a razão que leva Portas a fazer tal apologia. Tal como a faz Miguel Relvas. Ou Martins da Cruz (outro comentador, ao qual os locutores não tratam pelo primeiro nome - como agora é hábito pateta - mas sempre com as mesuras sacralizadoras do "Senhor Embaixador"...). Porque farão estes tipos, e alguns outros, tais apologias ao status quo de Moçambique. É que muitos resmungam diante da cumplicidade (arteriosclerosada) do PCP e do silêncio camarada do PS (no qual ainda há quem pense enviar António Vitorino para Belém..). E há até quem proteste com a atrapalhação de Rangel ou a diletante pressa de Montenegro diante de Moçambique. Mas ninguém se pergunta da razão que leva estes "intelectuais públicos" de "direita" a opinar deste modo sobre o país nosso aliado... Faço uma proposta àqueles que são sensíveis às argumentações destes ex-ministros sobre Moçambique - até por sua simpatia para com discursos oriundos deste sector direitista da opinião política. Jaime Nogueira Pinto é uma homem da "direita profunda". E é, nas suas características próprias e respectiva mundividência, um verdadeiro "intelectual público". E conhece muito bem - muitíssimo, diria eu - Moçambique e os seus intervenientes políticos. E acaba de publicar sobre aquele país este artigo: "Moçambique: no limite do desespero". Ou seja, bem desejo que os meus compatriotas que se querem informar sobre Moçambique, e que tendem para o lado destro, leiam este Nogueira Pinto. E mudem de canal televisivo quando os outros começarem a perorar, seguindo eles razões que a (boa) razão desconhece...