Bancos voltaram à Fontes Pereira de Melo, mas a “luta das paragens não acabou”
Depois de o grupo Infraestrutura Pública ter colocado cadeiras num abrigo de autocarro que apenas tinha encosto, JCDecaux apareceu na noite seguinte e instalou um banco. “É porque assumem que está errado.”
Há vários meses que as críticas dos cidadãos se multiplicam quanto ao trabalho de substituição dos abrigos de paragem de autocarro em Lisboa. Seja pelo ruído causado pela publicidade, seja pela falta de iluminação, pela ineficiência contra a chuva e o vento, pela destruição de raízes de árvores e de desenhos da calçada ou, ainda, pela existência de encostos no lugar de assentos em algumas das estruturas. Foi este último ponto o motor de uma das mais recentes intervenções do colectivo Infraestrutura Pública que, depois de em Novembro ter colocado um banco numa das paragens da Avenida Fontes Pereira de Melo, voltou na passada quinta-feira, 23 de Janeiro, à mesma via, para colocar cadeiras noutra paragem. Mais uma vez em protesto. Dada a insistência, a JCDecaux (que explora desde 2022 as paragens de autocarro de Lisboa) decidiu substituir os encostos por bancos em ambos os locais.
A operação aconteceu durante a noite de sexta-feira, o dia a seguir à acção da Infraestrutura Pública, de "forma muito rápida". "Tivemos pessoas a mandar-nos fotos dos trabalhadores da JCDecaux a montarem os bancos e, passado pouco mais de uma hora, fomos lá. Quando chegámos, já tinham ido embora. Via-se ainda um bocado de areia no chão, mas estava tudo montado", relata Marta, do colectivo, à Time Out. "Se foram lá substituir tão rápido, primeiro, é porque há meios e as coisas podem fazer-se muito facilmente. Depois, é porque assumem que está errado" as paragens terem encostos em vez de bancos para as pessoas se sentarem, analisa a activista.
Mais de 30 abrigos sem assentos na cidade
A solução do encosto não é de sempre. Nas paragens em causa, por exemplo, chegaram a existir bancos. "Temos fotos, do Google Maps e não só, onde dá para ver as pessoas sentadas à espera do autocarro", em diferentes abrigos da cidade onde agora existem encostos que alegadamente se enquadram nas "obras de melhoria" anunciadas pela autarquia e assumidas pela JCDecaux, dá conta Marta. A JCDecaux diz que são 2% os novos abrigos sem assentos, estimando-se assim que sejam mais de 30 nas condições em que estiveram, durante meses, as paragens da Fontes Pereira de Melo. "Temos um documento com alguns exemplos, como na Rua de Sapadores, na Estrada da Luz, na Rua de São Paulo ou no Prior Velho", enumera Marta, atestando que, por isso, "esta luta das paragens não acabou". "Estas obras a que chamaram de melhoria não melhoraram as condições para as pessoas. Só pioraram. Nós actuámos na Fontes Pereira de Melo como exemplo e agora repuseram os bancos, mas é estúpido se estiverem à espera de mais barulho para repor os restantes", analisa.
A dimensão do passeio da Avenida Fontes Pereira de Melo chegou a ser dada como motivo para que, em ambas as paragens, existissem encostos em vez de assentos. Com bancos em passeios estreitos, pessoas em cadeiras de rodas, por exemplo, não conseguiriam passar, justificou Carlos Moedas, presidente da Câmara Municipal de Lisboa (CML), numa reunião pública da autarquia. Também a empresa concessionária fala no "cumprimento rigoroso da legislação de acessibilidade". Mas, para o colectivo, "tirar um banco nunca pode ser solução". Se a área dedicada ao peão é curta, "têm de se alargar os passeios, ter outras abordagens". "Uma pessoa com muletas ou idosa não tem de ficar de pé", insiste a activista. Além disso, o colectivo garante que existem "passeios largos onde há encostos e passeios mais estreitos onde há bancos", não conseguindo descobrir uma lógica por detrás das decisões explanadas no contrato assinado em 2022 entre a CML e a multinacional de origem francesa.
Na quinta-feira, dia 23 de Janeiro, as cadeiras colocadas pelos activistas mantiveram-se no abrigo da Avenida Fontes Pereira de Melo durante três horas. A acção terminou com a chegada de uma carrinha da JCDecaux ao local, que retirou os assentos "como se estivesse a proteger a cidade". "Mas aquelas pessoas estavam só ali sentadas, à espera do autocarro", observa Marta, do Infraestrutura Pública.